Consumo Compensatório

16 fev

Consumo Compensatório

Nem sempre decisões de consumo são racionais ou lineares, os consumidores compram, em muitos momentos, de forma projetiva, baseados não em quem são, mas em quem gostariam de ser. O consumo compensatório busca reduzir ou adequar esta incongruência e a autodiscrepância do consumidor, de forma que possa promover um equilíbrio entre o eu real e o eu ideal.

O consumo fornece um valor psicológico, muito significativo e que vai além da mera autocompletar simbólico, dissociação, escapismo e compensação fluida de um produto ou serviço. Caso contrário o que explicaria o desejo do consumidor em comprar uma bolsa 5 mil dólares por exemplo.

Existem variados motivos psicológicos para o consumo, dentre eles a sinalização de status, prazer experiencial e a extensão do eu. Buscaremos entender aqui, baseado no modelo do Comportamento Compensatório de Naomi Mandel, como as autodiscrepâncias impulsionam o comportamento do consumidor.

Entendedo o Modelo Modelo Comportamental Compensatório do Consumidor

A mente humana busca manter níveis estáticos ou controlados de ativos psicológicos relacionados ao eu. Dentre eles temos a autoestima, senso de pertencimento, sentimentos de poder e controle sobre o ambiente. Diante deste processo os indivíduos buscam por meio da autoregulação medir a distância entre o seu estado atual (ou o eu real) e um estado desejado (o eu ideal).

O desejo de consumo se inicia quanto um consumidor percebe relativa discrepância entre o seu eu real e o ideal, gerando um impulso de consumo em busca de um equilíbrio ou aproximação do seu eu ideal. Como exemplo, uma pessoa rejeitada em um relacionamento, pode entender a sua aparência como o fio condutor e buscar ajustar a sua imagem em busca de maior realização. Da mesma forma, como pensamos de forma projetada ao que está em nosso alcance, a publicidade, modelos e aparência física mais valorizada em determinado momento, nos causa desconforto e uma motivação para buscar se adequar aquela imagem projetada.

A autodiscrepância pode produzir consequências afetivas, cognitivas ou mesmo fisiológicas se não resolvidas. A redução destas discrepâncias pode vir de várias formas, mas o consumo exerce um grande potencial para redução da autodiscrepância.

Assim como a sua não resolução podem produzir emoções negativas, de decepção, insatisfação, ansiedade ou desânimo, assim como possivelmente a vergonha, culpa ou constrangimento. Tais fatores podem exercer forte influência na compra impulsiva, não planejada, por parte dos consumidores.

Existem diferentes fontes de autodiscrepância com efeito sobre o comportamento dos consumidores, como:

Autodiscrepância relacionada ao autoconceito

Este é um processo interno, de autorreconhecimento, que pode ser afetado por um estado de inadequação ou desconforto com o estado atual. Como exemplo, uma pessoa que se sinta insegura em relação a sua inteligência pode se sentir motivado e priorizar a comprar produtos que melhores sua associação a imagem que queira projetar (passar a usar um óculos, uma caneta especial ou seu vestimento), ao invés de outros que não relacionados a inteligência (como um tênis esportivo, um short).

Autodiscrepâncias relacionadas à posição de alguém ou comparação com os outros

A comparação social também exerce forte impacto para resolução da autodiscrepância. A comparação como o outro pode nos influência em busca de equiparação ou superação. Exemplo, imagens de modelos magras podem diminuir a autoestima das pessoas e produzir um efeito compensatório no consumidor em busca de aproximação aquela projeção física. Mas também pode, por exemplo, direcionar nossos esforços de consumo, caso se sintam menos poderosos, a ter maior propensão de consumo de produtos de alto-status ou luxuosos.

Os seres humanos também têm forte necessidade de estabelecer relações sociais, que podem trazer discrepâncias quando as pessoas se sentem excluídas em relação a um grupo de referência importante. Ao se sentir rejeitado uma pessoa pode se tornar mais propensa a adquirir produtos para serem valorizados dentro do seu grupo ou que melhores seu status relacional.

 Autodiscrepâncias relacionadas aos grupos sociais

A identidade social é parte da personalidade, da construção do seu eu ideal, e consiste na participação de grupos que podem fornecer uma importante fonte de autoestima. A discrepância entre a identidade social real e a desejada, leva a um comportamento compensatório do consumidor, na busca de produtos que os associe ao grupo, comportamento, crença outros fatores que os influencie e promovam senso de pertencimento.

Grande parte do que consumimos é para nos reafirmarmos dentro de um grupo.

5 estratégias distintas que os consumidores utilizam para lidar com autodiscrepâncias

O Modelo Compensatório de Comportamento do Consumidor busca compreender por que é que uma autodiscrepância desencadeia uma motivação para reduzir essa discrepância, e como esta motivação leva a um conjunto identificável de comportamentos de consumo.

São 5 as estratégias que os consumidores utilizam para lidar com autodiscrepância: a resolução direta, o autocompletar simbólico, a dissociação, o escapismo e compensação fluida.

1.      Resolução direta

“Na resolução direta, os consumidores adotam comportamentos que abordam diretamente a origem da autodiscrepância. Esta estratégia representa uma forma de comportamento direcionado a objetivos, onde os consumidores compram ou usam produtos que podem resolver diretamente uma autodiscrepância. Por exemplo, se os consumidores experienciarem discrepâncias entre o seu peso ou aparência real versus desejado (por exemplo, Bagozzi & Dholakia, 1999), poderão inscrever-se numa academia ou realizar uma cirurgia plástica para melhorar a sua aparência (Schouten, 1991).” (Naomi Mandel 2016).

2.      Autopreenchimento simbólico

“Ao contrário da resolução direta, o autopreenchimento simbólico aborda uma autodiscrepância sem abordar diretamente sua fonte. Por exemplo, Wicklund e Gollwitzer (1982) descobriram que os estudantes de MBA que não possuíam certos indicadores objetivos de sucesso empresarial (por exemplo, um cargo elevado, múltiplas ofertas de emprego) eram mais propensos a exibir outros indicadores simbólicos de sucesso empresarial (por exemplo, ternos caros e relógios).” (Naomi Mandel 2016).

O valor simbólico, neste caso, se dá por uma questão se reafirmação por meio de produtos que tragam consigo elementos, simbolismos, que reduzam a discrepância sobre uma frustração ou comportamento ambicionado.

3.      Dissociação

“Uma terceira maneira pela qual as pessoas podem usar o comportamento do consumidor em resposta à autodiscrepância é pela dissociação (White e Dahl 2006). Enquanto as duas estratégias anteriores discutidas acima tendem a afetar o comportamento do consumidor, aumentando o consumo dentro de um domínio relacionado à discrepância (ou seja, os consumidores procuram adquirir produtos para resolver o problema literal ou simbolicamente), a dissociação implica evitar compras no domínio da autoestima.” (Naomi Mandel 2016).

A dissociação é uma forma de responder aos grupos e comportamentos dos quais não está de acordo ou que busca se afastar. Ao desidentificar-se os consumidores passam a rejeitar e não consumir produtos associados a determinados grupos ou perfis específicos. Normalmente a dissociação está atrelado a uma crença ou estereótipo. A dissociação também pode ser uma forma de reafirmação de um conjunto de crenças, grupos ou estereótipos aos quais está ou busca se associar. Ao me afastar de determinados estereótipos, naturalmente posse entender que estou me aproximando de outros.

Como exemplos, temos visto impacto direto de dissociação (“boicote”) a determinados produtos que mais se associaram a determinados perfis políticos ou determinados estereótipos.  Ou mesmo quando um consumidor ou grupo rejeita determinados produtos ou marcas que representam a personalidade de outro grupo.

4.      Escapismo

“As consequências cognitivas, afetivas e fisiológicas das autodiscrepâncias podem persistir porque as pessoas tendem a ruminar sobre autodiscrepâncias ativadas (Brunstein & Gollwitzer, 1996; Lisjak et al., 2015). Uma estratégia para mitigar esses fatores motivacionais negativos é distrair-se ou evitar pensar na autodiscrepância.

O escapismo envolve deliberadamente desviar os pensamentos de uma discrepância consigo mesmo, voltando a atenção para outro lugar; no domínio do comportamento do consumidor, o escapismo pode manifestar-se ao concentrar a atenção em comer ou fazer compras. Na verdade, esta noção de escapismo é tão difundida que foi até apelidada de “terapia de varejo” (Atalay & Meloy 2011).” (Naomi Mandel 2016).

Pessoas que não alcançam o objetivo de determinados padrões sociais, podem buscar no consumo uma forma de desviar sua atenção a estímulos hedônicos, como alimentos e bebidas. Alguns estudos mostram que consumidores buscam produtos como biscoitos e chocolates para reduzir a autoconsciência e, portanto, as autodiscrepâncias salientes.

Além disso, as pessoas podem assistir a filmes escapistas ou assistir compulsivamente a uma série de televisão como forma de evitar o autofoco (Moskalenko & Heine 2003). Notavelmente, nenhum destes comportamentos resolve necessariamente o problema, mas reduzem momentaneamente a autodiscrepância. Eventualmente podem até reduzir a importância de determinada autodiscrepância. Funcionam como um efeito compensador.

5.      Compensação Fluida

“Finalmente, na compensação fluida, as pessoas abordam uma autodiscrepância afirmando-se num domínio distinto do domínio da autodiscrepância (Heine, Proulx e Vohs, 2006; Lisjak et al., 2015). A ideia de compensação fluida é um princípio central da teoria da autoafirmação.”

Na autoafirmação temos um movimento de autodiscrepância distante da realidade ou difícil de ser alcançado, estimulando outros comportamentos e associações que diferem daquele objetivo, se voltando para outros objetivos compensatórios. Um individuo, na compensação fluída, pode superar uma discrepância em uma dimensão encontrando significado em outra.

Note que a compensação fluida é conceptualmente distinta do escapismo: sob a compensação fluida, os indivíduos afirmam as suas identidades numa dimensão não ameaçada, enquanto sob o escapismo, os indivíduos envolvem-se em comportamentos que não estão relacionados consigo próprios, apenas como um meio de distração.

Como exemplo, consumidores que se comparam a modelos de publicidade idealizados (entendendo um distanciamento entre seu desejo e esforço para alcançar o objetivo) podem reforçar posteriormente sua inteligência, fazendo escolhas de consumo mais racionais, ou mesmo se concentrar em outras autodiscrepâncias mais próximas da sua realidade.

Conclusão

As pessoas são motivadas a resolver discrepâncias entre pessoais, buscando resolver o conflito existente entre a forma que se vê atualmente e como desejam se ver.  A resolução destas discrepâncias pode ocorrer de diversas formas, como adotar comportamentos ou pensamentos mais racionais e que reduzam as discrepâncias, centra-se em sí, minimizando a sua importância, ou mesmo não pensa na discrepância.

Ainda assim, o consumo sempre estará presente e atuando com força para redução da autodiscrepância. Com base no conteúdo acima, existem diversas medidas compensatórias que podem mitigar eficazmente a autodiscrepância, mas cada qual seguindo por um caminho diferente.

No caso do autopreenchimento simbólico, o consumidor resolve a discrepância através da aquisição de um símbolo da identidade desejada, ligado diretamente ao consumo de produtos que reduzem a discrepância. Em vez de abordar a origem da discrepância, a auto-conclusão (ou autopreenchimento simbólico) reduz a discrepância recorrendo a outros sinais de sucesso dentro do domínio da discrepância.

A dissociação separa, ou afasta o individuo dos bens de consumo que reforçariam a discrepância ao qual ele rejeita. Ao distanciar a autodiscrepância do eu central, esta estratégia provavelmente reduz a importância da autodiscrepância, mas não necessariamente a elimina ou reduz sua importância.

No caso do escapismo, o consumo serve para distrair um indivíduo de pensar sobre a discrepância, o que provavelmente reduz sua relevância. Já a compensação fluida permite que os atores encontrem significado noutro aspecto do eu, o que provavelmente tira o foco da autodiscrepância.

Entender o papel que determinados produtos e/ou marcas tem sobre o preenchimento das autodiscrepâncias, importância e representação para os consumidores, além sua o nível de esforço empregado para sua aquisição, pode ser chave para direcionar uma estratégia de comunicação mais assertiva e influente sobre a decisão de compra dos consumidores.

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